Catarse, um meio de purificação da alma
Segundo
Aristóteles, filósofo grego, a Catarse é o meio através do qual o Homem
purifica sua alma, através da representação trágica. Para ele, a tragédia é um
estilo derivado da poética dramática, e consiste na reprodução de ações nobres,
por intermédio de atores, os quais imitam no palco as desventuras dos heróis
trágicos que, por escolhas mal realizadas, passam da felicidade para a
infelicidade, provocando na plateia sentimentos de terror e piedade, purgando
assim as emoções humanas.
Desta
forma, não basta que pessoas boas repentinamente atravessem a ponte que leva da
graça para a desgraça, nem que seres maus encontrem a desdita; enfim, qualquer
revés da sorte que atingir pessoas comuns não suscitará nas testemunhas destes
eventos os sentimentos necessários para desencadear uma descarga emocional.
Este mecanismo apenas surte efeito quando os acontecimentos giram em torno de
personagens extraordinários que causam, através de suas ações desastrosas,
alguma espécie de desmedida, como, por exemplo, Édipo Rei, quando de rei tebano
passa a amante da própria mãe, pune-se ao cegar a si próprio e parte para o
exílio. Ou seja, quando a desdita ocorre a quem não detém o merecimento.
O
nascimento da tragédia está, conforme defende Aristóteles, ligado a práticas
religiosas e a rituais realizados em honra de Dionísio, deus do vinho, da
embriaguez, da loucura. Os artistas honravam esta divindade através da
apresentação dos ditirambos – canto de natureza coral, intenso e apaixonado,
composto de uma esfera narrativa, declamada pelo cantor mais importante do
grupo, também chamado corifeu, e de uma parte coral, interpretada por
personagens caracterizados como faunos e sátiros, conhecidos seguidores de
Dionísio -, que são considerados precursores do teatro grego.
Desta
forma, a catarse pode ser vista como pacificação e exaustão de forças
embriagadoras e insanas que são invocadas pela tragédia, que por sua vez tem em
sua raiz justamente esse mecanismo ritualístico herdado dos ditirambos criados
para homenagear Dionísio, os quais evoluíram para a modalidade trágica. Com a
decadência da literatura greco-romana, a catarse foi herdada por outros estilos
poéticos, assumindo novas formas conforme a evolução histórica da poética.
A
catarse também está presente na psicanálise, criada pelo austríaco Sigmund
Freud. Se, por um lado, a poesia dramática se inspira em moldes religiosos
ancestrais, o modelo seguido por Freud é o da simbolização poética. Freud
descreve como estados catárticos o que seu mestre, Breuer, induzia nos
pacientes através da hipnose, um meio de contornar as censuras estabelecidas
pelo superego, e propiciar aos enfermos da mente a possibilidade de reviver
seus traumas e, assim, superá-los. Com o tempo, porém, Freud substituiu este
método pelo da associação livre de ideias, a ‘cura pela palavra’.
Carl
Gustav Jung, discípulo de Freud que logo depois rompe com seu mestre, destaca
quatro etapas no tratamento analítico de seus pacientes. O primeiro deles
corresponde à catarse, que o psicólogo compara à confissão, prática ancestral
associada a rituais de iniciação. Este exercício deve propiciar à pessoa
demolir suas defesas internas ao compartilhar com alguém o que está
sobrecarregando seu self. Assim, ao concretizar este mecanismo catártico, ela
ingressa em uma nova fase de amadurecimento.
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